Em 18 de junho de 2025, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil anunciou mais um aumento na taxa Selic, elevando-a para 15% ao ano, o maior patamar em quase duas décadas. A decisão, tomada por unanimidade, reflete a tentativa de conter uma inflação persistente, mas reacende debates sobre os impactos na economia e a possibilidade de uma crise iminente. O que significa esse aumento? Como ele afeta o bolso dos brasileiros, as empresas e o futuro do país? E, mais importante, estamos caminhando para um colapso econômico ou apenas enfrentando uma fase de ajustes dolorosos?
O Contexto do Aumento da Selic
Por que a Selic subiu para 15%?
A Selic, taxa básica de juros da economia brasileira, é o principal instrumento do Banco Central para controlar a inflação. Desde setembro de 2024, o Copom iniciou um ciclo de alta nos juros, motivado por uma inflação que fechou 2024 em 4,83%, acima da meta de 3%, e continuou a pressionar em 2025, alcançando 5,06% em fevereiro, segundo o IBGE. Fatores como o aquecimento da economia, baixo desemprego (7,5%, o menor desde 2015) e incertezas fiscais contribuíram para a decisão.
O comunicado do Copom destacou “um cenário de elevada incerteza” e a necessidade de uma política monetária mais restritiva. A alta dos preços de alimentos (como a carne, que subiu 7,54% entre outubro e novembro de 2024, segundo o IPCA-15) e energia, somada à desvalorização do real frente ao dólar, intensificou as pressões inflacionárias.
Um movimento esperado, mas controverso
Analistas já previam o aumento, com o boletim Focus projetando a Selic em 15% até o fim de 2025. No entanto, a decisão não foi unânime entre os economistas. Para alguns, como Victor Gomes, da Universidade de Brasília, juros altos são um “remédio amargo, mas necessário” para evitar uma inflação descontrolada, algo que o Brasil conhece bem de sua história. Outros, como José Luiz Pagnussat, da Enap, criticam a medida, argumentando que ela freia o crescimento econômico sem resolver problemas estruturais.
Impactos da Selic a 15% na Economia
Consumo e crédito: o bolso do brasileiro sente o peso
Com a Selic em 15%, o custo do crédito dispara. Empréstimos, financiamentos e parcelamentos no cartão de crédito ficam mais caros, desestimulando o consumo. “Se você planejava financiar um carro ou uma casa, vai pagar mais”, explica Jonathas Goulart, economista da Firjan. O impacto é imediato em bens duráveis, como eletrodomésticos e veículos, cujo consumo depende de crédito.
Dados do Banco Central mostram que, em março de 2025, a taxa média de juros para empresas subiu para 22,8% ao ano, enquanto para consumidores chegou a 40%. Isso reduz a demanda, mas também aumenta o endividamento das famílias, já pressionadas pela alta de preços. “O brasileiro prioriza o essencial, como alimentação, e corta supérfluos”, aponta Goulart.
Empresas e investimentos: freio na expansão
O aumento da Selic encarece o capital para as empresas, dificultando investimentos em expansão, contratações ou modernização. Setores como construção civil, que dependem de financiamentos, são particularmente afetados. Segundo Leticia Morgan, em artigo no Migalhas, construtoras enfrentam custos mais altos para aportes bancários, o que pode reduzir lançamentos imobiliários e gerar estoques de imóveis.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) alertou que a alta dos juros eleva os custos financeiros das empresas, impactando preços e competitividade. Além disso, o risco de desemprego cresce, já que menos investimentos significam menos contratações. “Juros altos podem levar a uma desaceleração que afeta o mercado de trabalho”, diz Luis Otávio Leal, da G5 Partners.
Dívida pública: um fardo mais pesado
Outro efeito preocupante é o aumento do custo da dívida pública. Cada ponto percentual a mais na Selic eleva o custo da dívida bruta federal em cerca de R$ 50 bilhões, segundo estimativas do Banco Central. Em 2024, a dívida pública bruta atingiu 76,5% do PIB, e a CNI projeta 79,4% até o fim de 2025. Esse cenário amplia o risco fiscal, alimentando incertezas sobre a sustentabilidade das contas públicas.
Estamos Perto de uma Crise Econômica?
Sinais de alerta
Vários indicadores sugerem cautela. A inflação persistentemente acima da meta, combinada com a desvalorização do real (o dólar subiu quase 20% em 2024, de R$ 4,85 para cerca de R$ 5,80) e incertezas globais, como as políticas comerciais de Donald Trump, cria um ambiente instável. A XP Investimentos projeta que a Selic pode chegar a 15,5% em meados de 2025, caso a inflação não ceda.
Além disso, o pacote fiscal do governo, criticado por sua lentidão no Congresso, não conseguiu ancorar as expectativas de controle do déficit. “Se o governo gastar além do que arrecada, a pressão inflacionária continua”, alerta Tatiana Pinheiro, da Galápagos Capital.
Contrapontos: há espaço para otimismo?
Nem todos os analistas veem uma crise iminente. O Copom observou sinais de desaceleração econômica, como o PIB de 0,2% no último trimestre de 2024, sugerindo que a política monetária está começando a surtir efeito. A queda nos preços do petróleo (de US$ 75 para US$ 62 por barril em maio de 2025) e a redução do diesel nas refinarias da Petrobras podem aliviar a inflação.
William Castro Alves, da Avenue, aponta que uma possível recessão global, impulsionada por tarifas de Trump, poderia reduzir a pressão sobre os preços das commodities, ajudando o Brasil a pausar o ciclo de alta dos juros já em junho de 2025. O boletim Focus também prevê um crescimento do PIB de 2% em 2025, indicando resiliência econômica.
O impacto desigual da Selic
Um estudo da USP, conduzido por Marina Sanches, revela que o aumento da Selic não afeta todos os setores igualmente. Alimentos, bebidas e vestuário são mais sensíveis aos juros, enquanto saúde e habitação respondem menos. “Se a inflação for puxada por transportes, a Selic terá menos eficácia”, explica Sanches. Isso sugere que o Banco Central precisa calibrar suas decisões com cuidado, para evitar sacrificar a economia sem alcançar o controle inflacionário.
Perspectivas para o Futuro
Quando os juros vão cair?
A grande pergunta é quando o ciclo de alta dos juros será interrompido. O Inter projeta uma queda a partir de novembro de 2025, com a Selic em 14,75%, enquanto o PicPay aposta em janeiro de 2026, com a taxa em 15%. A XP, mais cautelosa, prevê cortes apenas em 2026, com a Selic caindo para 12,5% até dezembro. “Tudo depende de uma desaceleração ordenada e do controle fiscal”, diz Rodolfo Margato, da XP.
O que o brasileiro pode fazer?
Para o consumidor, a alta da Selic torna a renda fixa, como CDBs, LCIs e Tesouro Selic, mais atrativa. “É hora de aproveitar os pós-fixados”, sugere o blog Daycoval. No entanto, diversificar investimentos e evitar dívidas de alto custo são estratégias essenciais. Para empresas, planejamento financeiro e redução de riscos jurídicos são cruciais, segundo Morgan.
Reflexões finais
O aumento da Selic para 15% é um movimento arriscado, mas calculado, para domar a inflação. No entanto, seus efeitos colaterais – menor consumo, freio nos investimentos e maior custo da dívida pública – colocam o Brasil em uma encruzilhada. Estamos à beira de uma crise? Ainda não, mas o caminho exige cautela.
A política fiscal, a inflação global e a confiança dos investidores serão determinantes. Como disse Victor Gomes, “o Brasil já sofreu muito com inflação alta”. A questão é se o remédio dos juros altos salvará a economia ou apenas prolongará a convalescença. O que você acha? O Brasil conseguirá equilibrar crescimento e estabilidade?